segunda-feira, 1 de agosto de 2011

A casinha de estores...

Algumas das histórias da minha família são tão míticas que perduram nas nossas memórias. A nossa casa na Maia começou por ser um anexo no fundo do quintal e foi sendo ampliado ao longo do tempo com muito esforço. Foi nessa empresa que aprendi a arte de ser moço de trolha, ganhando muito calos a fazer e transportar carradas de cimento armado. O meu pai foi construindo outros anexos, com ferramentas e materiais muito originais que ia encontrando. Um dia chegou a casa com uma quantidade enorme de material que foi deitado fora pelo pessoal da fábrica de estores que existia nas proximidades da nossa casa e resolveu que faria um anexo para os animais da nossa pequena quinta. E tão bonita ficou a “casinha” de estores de madeira que a minha irmã sonhava secretamente em ir morar para lá, apesar do seu tamanho minúsculo. Na parte de cima moravam os pombos e na parte de baixo habitava o porco, que com o passar do tempo quase que levantava o pequeno anexo com o focinho. E era hilariante o olhar admirado das pessoas que viam a construção mexer-se num balanço rítmico e avisavam o meu pai, oh senhor António, olhe que o porco está fugir com o aido às costas! De entre os pombos que andavam lá por casa, um era especial porque seguia a minha mãe para todo o lado. Chamava-se Gaspar e dei-lhe o nome por causa de desenho animado que preenchia o vazio de programação da RTP sempre que havia uma alteração de última hora. Não me lembro quantos vezes passou essa história de uma lagarta que vivia numa maça e que se metamorfoseava numa borboleta, mas acho que deve haver muita gente da minha geração que se lembra deste pequeno filme. O Gaspar chegava a seguir a minha mãe quando ela ia trabalhar e foi nessa rotina que teve um encontro com um camião, ao qual não sobreviveu. Com o passar do tempo fomos perdendo os pombos e agora só temos um lá em casa que na realidade é um cão. Confuso? Pois é, só o meu irmão mais novo é que se lembrava de chamar pombo ao nosso cão, mas como o nome alternativo era rolha acho que ficamos a ganhar. Um dia chegou a altura de matar o porco e como o meu pai era pouco habituado a essas lides seguiu o conselho de um colega do trabalho chamado Pinheiro e chamou o pai deste para fazer o trabalho. O clã Pinheiro era constituído pelo pai e pelos dois irmãos que viviam numa casa na Devesa. Um dos filhos era pastor com um secreto carinho pelas suas ovelhas, enquanto o outro que trabalhava com o meu pai, era um bocado aluado, para não usar outras expressões menos lisonjeiras. Já se pode deduzir que todos aqueles genes vieram do chefe do clã, a quem o meu pai numa decisão pouco acertada tinha incumbido de matar o porco. A matança correu tão mal como seria de esperar e o famoso matador de porcos usou de tudo como desculpa, chegando a dizer que o bicho não morria por causa da minha irmã, que estava a chorar com pena do porco. Claro que e o meu pai acabou por levar a melhor e quando encontrou o filho do matador no trabalho, aproveitou para gozar com a credulidade deste. Quando lhe perguntou se tinha corrido bem a matança diz-lhe o meu pai - Ouve lá, o teu pai não é grande matador! Deixamos o porco em cima do carro de bois depois da matança para comer uma bucha e quando demos conta, estava ele a comer-me as couves do quintal! Mal as mastigava, saiam-lhe pelo buraco da faca! E não é o que o filho do Pinheiro acreditou…